A foto aí em cima é da mesquita de Touba, segundo maior centro de peregrinação do Islã depois da Meca.
Estivemos lá apenas duas semanas antes do lugar receber dois milhões de muçulmanos para celebrar o legado de Amadou Bamba (1854-1927), um dos maiores líderes religiosos da história africana.
E esta é a história de como jantamos Yassa e coca-cola com seu neto, representante direto na linha sucessória de seu califado.
Fundador do Mouridismo, - ordem sufí mais influente entre as quatro existentes no Islã senegalês -, Amadou Bamba liderou uma das mais exitosas resistências pacíficas já registradas contra o colonialismo francês, a ponto de ser considerado uma espécie de Gandhi africano.
Temendo que liderasse uma Jihad – tamanho era seu poder na conversão de reis e demais lideranças políticas senegalesas para o Islã–, os franceses chegaram a exilá-lo no Gabão e na Mauritânea.
Deste exílio contam-se diversos milagres, como a vez em que Bamba teria se atirado ao mar de uma caravela francesa – onde a reza era proibida - para fazer suas preces sobre o Atlântico, em tapete de oração que surgisse assim encantado do oceano.
E como não adiantasse dar murro em ponto de faca – e cada investida contra ele resultasse em mais seguidores -, os franceses concederiam, em 1925, o direito para que Bamba fundasse no Senegal sua própria cidade: Touba. E que ali fosse enterrado, em 1927, sem jamais ter proposto uma única investida violenta contra seus opressores – a quem tratou de responder com barricadas de espirito.
Espécie de Vaticano islâmico, a “cidade sagrada” de Touba constitui até hoje uma zona administrativa autônoma com status legal especial dentro do Senegal. Ali turistas, peregrinos e os mais de 500 mil fieis que habitam a cidade estão proibidos de beber e fumar, bem como dançar e fazer música na rua.
Os herdeiros na administração da fé e da cidade foram os cinco filhos de Bamba, que se sucederam hereditariamente como os califas de Touba. E agora que todos já faleceram, abriu-se o califado para os netos.
Entre eles está Serigne Mam Mor Mbacke Falilou, que nos recebeu para um jantar com Yassa, Fanta, Sprite e Coca-Cola no departamento de agronomia que lidera no Senegal. E como representante direto da linha sucessória de Bamba, Serigne já dá mostras do papel que a história lhe reserva: no ano passado, coube a ele reunir-se com o papa Bento XVI em nome da defesa do diálogo inter-religioso no mundo.
Ele nos fala de sua paixão por plantar, do desejo de vir ao Brasil conhecer novas técnicas que possa aplicar em sua fazenda e nos demais rincões agrícolas senegaleses. Bem-humorado, brinca também com a vontade de desvendar o que afinal é isto que se fala do carnaval brasileiro.
E pede desculpas pelo jantar simples, sobre um tapete gasto no pátio, que nos ofereceu.
Não sei se percebeu que foi exatamente a falta de um banquete – e de toda esta ostentação que geralmente determina as elites religiosas – o que mais me impressionou.
2 comentários:
Vinícius, parabéns pelo blog, pelo conteúdo, pela forma despojada e instigante que descreve o que viu e sentiu.
Continue, que tem eu e um monte de gente interessada em ler seus relatos.
Grande abraço... do blogueiro Augusto
http://viajantesustentavel.blogspot.com/
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